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ESG e regulação

Escrevo este artigo para provocar mais reflexões do que apontar certezas. Nossa contemporaneidade nos trouxe benesses e confortos inimagináveis nos tempos de nossos avós. Mas, como em todos os avanços, também apresentou novos desafios em escala global.

Já vivenciamos em nossa história estes momentos marcantes que parecer pontuar o fim de uma era e o começo de outra. Talvez estejamos diante de mais um destes períodos de ruptura cultural, ambiental, social e até mesmo civilizatória mesmo que muitos de nós, eu inclusive, ainda não tenhamos uma exata noção do conjunto de dilemas que se entrelaçam e demandam soluções para a nossa sobrevivência enquanto espécie.

Faço este texto sob o impacto das decisões do autocrata Vladimir Putin e sua declaração de reconhecimento da independência de regiões separatistas pró-russas da Ucrânia. O chefe do governo russo declarou que os acordos de paz apoiados pelo Ocidente no leste da Ucrânia não existem mais e iniciou uma escalada militar.

Numa decisão unilateral, a lei internacional, a civilidade da diplomacia baseada em tratados e acordos legais deixou de existir ao sabor de interesses variados da política, das finanças e de determinados grupos de interesse que operam globalmente.

Mas qual o sentido de citar o líder da Rússia e a crise nas fronteiras da Ucrânia, num artigo sobre ESG e regulação? Ora, peço apenas um pouco mais de paciência e que acompanhem minha linha de raciocínio para conectarmos pontos de vista e referências aparentemente fragmentadas.

Quero dar pistas para irmos além do costumeiro dia a dia das empresas, de suas metas comerciais, cobranças e seus impactos ambientais, sociais e de governança.

A lei é para todos?

Olhando para o distante ano de 1920, lembro a implementação da Lei Seca votada e aprovada nos EUA e cujo objetivo era proteger os cidadãos de perigos causados pelo álcool e seu consumo. Era uma lei “do bem”. Quando vemos alguns filmes sobre mafiosos, geralmente temos como pano de fundo o contrabando de bebidas alcóolicas e a audácia do crime organizado cuja influência se ampliou a partir da promulgação dessa mesma Lei Seca que proibia a fabricação, o transporte e a venda de bebidas alcoólicas. Funcionou?

O consumo de bebidas nunca deixou de existir por causa da regulação ou da repressão policial e da famosa Lei Seca que foi revogada em 1933. Creio que hoje ela seja apenas uma boa referência para roteiros de Hollywood, uma vez que seus efeitos positivos nunca foram comprovados. A intenção era boa, mas na realidade a lei produziu ganhos vultuosos para o crime organizado.

Seguindo nesta mesma linha de raciocínio, olho para o Brasil e o emaranhado de leis, regulamentos, decretos e burocracias infindáveis nas esferas federal, estadual e municipal. Algum empresário (ou filósofo, eu não lembro) já disse que o Brasil é “um país hostil ao empreendedorismo”. A teia de certidões, licenças e alvarás existente é tamanha que realmente é de se aplaudir o empresário que deseja montar uma empresa mesmo diante do tamanho de Leviatã estatal.

O quanto a sobrecarga de leis apenas induz ao surgimento de um mercado paralelo? De uma informalidade? Indiferente aos mandos do tal poder regulador?

A força da lei, que parece tudo controlar e regular, funciona sempre muito bem no papel. Mas nem sempre funciona de fato. A agressão de Putin comprova muito bem isso. Mas voltemos ao Brasil. Recentemente vimos centenas de garimpeiros, com uma frota de dragas e empurradores ocupando o Rio Madeira na Amazônia para atuar de forma ilegal (ou desregulada) na extração de ouro. As leis ambientais e o código de mineração existem, mas não funcionaram neste caso. 

Talvez menos impactante do que imagens das balsas, numa nova modalidade de corrida do ouro nos rios, seja o contrabando de cigarros nas fronteiras brasileiras. Difícil de se controlar e coibir, o contrabando de tabaco compete de forma acintosa contra a indústria nacional legalizada.

A indústria brasileira de cigarros, pesadamente controlada, regulada, proibida de fazer propaganda e cerceada na forma de fazer comunicação dos seus produtos e suas atividades, segue cumprindo diretrizes de órgãos governamentais e buscando novas certificações de sustentabilidade, mas sofre a concorrência desleal dos contrabandistas. A lei funciona, para alguns. Não para outros.

Onde quero chegar com todos estes exemplos?

ESG e regulação.

Ainda existe uma crença muito arraigada sobre a força da legislação para alcançar determinados objetivos. Políticos adoram fazer novas leis e mostrar serviço aos eleitores. A Constituição Federal do Brasil é recheada de leis para praticamente qualquer assunto, mas até pelo Poder Judiciário encontramos casos de seu descumprimento.

Quando se faz um novo regulamento, surgem imediatamente novos custos para as atividades empresariais. Custos que muitas vezes serão lançados no preço final dos produtos e serviços, na redução de vagas de trabalho e até na possibilidade de ampliar ou diminuir investimentos neste ou naquele mercado. Custos que irão assustar aquele empreendedor que deseja abrir seu próprio negócio.

É evidente que todos nós defendemos indústrias mais limpas, ecologicamente corretas na produção e nas suas atividades, socialmente responsáveis e cuja governança seja confiável transparente e honesta. Existe uma massa crítica ganhando corpo quando se fala em ESG. Ser sustentável está na moda. Uma moda que chegou para ficar.

Os avanços que estamos testemunhando nos modelos de negócios são impressionantes. Há uma onda de renovação “pelo bem” nas empresas que não é exatamente igual em todos os segmentos ou atividades, muito embora seja notável que ela esteja ocorrendo.

Há alguns anos talvez ninguém escreveria sobre ESG numa revista de uma agência global de PR. O assunto estar nas pautas dos jornais, nas mídias sociais e nas mesas dos Conselhos de Administração já é uma notícia alvissareira. Positiva.

Existe muito “greenwashing” ou “esgwashing”? Com certeza. Dessa forma, temos muito o que fazer pela frente quando falamos de uma jornada ESG nas corporações. O mercado vai respondendo, muitas vezes aos trancos e barrancos, dando sinais de que a sustentabilidade é uma jornada de aprendizado. Fato é que tudo demanda recursos para ser implementado. Nada é feito de uma forma mágica, do dia para a noite. O que seria sensacional se fosse possível.

Educar e comunicar para ESG.

Eu, como professor e consultor de empresas em ESG, comunicação e reputação, entendo que a consciência de cada cidadão, de cada indivíduo é a força propulsora de mudanças e do crescimento.

A genialidade humana nos trouxe inovações e criou recursos onde antes nada existia. O progresso da nossa civilização foi feito com erros e acertos. Pessoas que perceberam oportunidades e fizeram acontecer a criação do seu futuro desejado, a partir de uma ambição individual foram capazes de construir uma vida melhor para milhares de outros seres-humanos. Nosso conforto, nossas opções de consumo e nosso progresso foi feito pelos que pensaram fora da caixa. Pelos que não estavam “regulados”. As burocracias nunca permitiram o indivíduo criar algo novo. Muito pelo contrário!

Hoje nós precisamos educar para a sustentabilidade e a comunicação é a chave para criar conexões e novos caminhos, criar novos mercados já sob a ótica ESG. Tudo precisa ser feito através de uma comunicação mais humana, que coloque nas mesas de reunião mais pontos em comum do que divergências, amplie consciências para que ninguém precise chamar os legisladores para nos dizer o que devemos fazer, quando e como.

Comunicar e educar é a chave para uma cidadania mais consciente de seus direitos e seus deveres. O futuro está em aberto. Está em nossas mãos, mentes e corações. Eu aposto nisso. E você?

ESTE ARTIGO FOI PUBLICADO NA COLUNA Actualidad EM Nueva tendencia Sostenibilidad: La regulación como impulso de la inversión con impacto DA AGÊNCIA DE COMUNICAÇÃO Llorente Y Cuenca, ESPANHA, EM 27 ABRIL/2022.